O regime político em vigor no Irão é único no mundo porque é uma república islâmica, onde uma mistura de poder judicial e teocracia xiita coexiste com instituições republicanas, eleições periódicas e um conselho de pessoas religiosas que têm a palavra final sobre os assuntos mais importantes do país. problemas. . Tudo sob a liderança e poder de veto do líder supremo iraniano, aiatolá Ali Khamenei, no cargo desde 1989.
Para entender o que pode mudar nesse regime político com a morte do então presidente Ebrahim Raisi, de 63 anos, após a queda do helicóptero em que estava no domingo (19), o Agência Brasil entrevistou dois especialistas do país persa, que acreditam que muito pouco pode mudar com a eleição do novo chefe do Executivo. A reclamação deve ocorrer em até 50 dias, a partir de segunda-feira (20). O líder supremo do Irã nomeou o vice-presidente Mohammad Mokhber como chefe de estado interino
O professor de história contemporânea da Universidade Federal Fluminense (UFF) Bernardo Kocher avaliou que, mesmo que seja eleito um presidente mais reformista, ele não deve mudar a essência das instituições iranianas.
“As instituições lá são sólidas, não são improvisadas e as regras mudam o tempo todo. Se um reformista vencer, como aconteceu no passado e não teve um impacto muito grande, as coisas deverão continuar como estão. A possibilidade é mais que vença a continuidade do que que vença a reforma”, afirmou Bernardo Kocher.
O jornalista, doutor em ciência política e professor de relações internacionais Bruno Lima Rocha avalia que é muito difícil uma grande mudança no regime iraniano com a morte de Raisi.
“Vejo que é muito difícil para uma luta pelo poder desmantelar as instituições do Irão. Mesmo mudanças relativas à política externa do Irão não deveriam acontecer. Nem no governo anterior, que foi moderado, isso aconteceu. Nem um governo, moderado ou conservador, abandonará aliados, nem um ou outro formará qualquer tipo de aliança com o Ocidente”, argumentou o também pós-doutorando em economia política internacional.
Com cerca de 88 milhões de habitantes, o Irã é um pouco maior que o estado do Amazonas, sendo um dos maiores produtores de petróleo do mundo, além de ter desenvolvido indústrias petroquímicas, navais, aeroespaciais e cibernéticas, segundo Rocha.
Regime político
Além do Executivo, do Parlamento e do Judiciário, o Irão tem um Conselho Guardião, composto por seis pessoas nomeadas pelo líder supremo do Irão, e seis membros nomeados pelo Poder Legislativo.
O Conselho Guardião tem o poder de interpretar a Constituição do Irã, além de avaliar se as leis aprovadas pelo Legislativo estão de acordo com as leis e a jurisprudência islâmica. Outra particularidade do regime iraniano é que existem assentos no Parlamento reservados a minorias étnicas e religiosas, como judeus, assírios e zoroastrianos.
Há também a Assembleia de Especialistas, composta por 86 religiosos eleitos pelo voto popular. Esta assembleia elege o aiatolá que será o líder supremo do Irão. Embora o cargo seja vitalício, a Assembleia de Peritos pode destituí-lo.
O principal posto do Irão, o líder supremo, pode vetar candidatos que podem concorrer a cargos eletivos e normalmente tem a última palavra nas decisões mais importantes, podendo até destituir o presidente.
Para o professor da UFF Bernardo Kocher, é um regime diferente de qualquer outro regime do planeta. “Ninguém é presidente do Irão sem ser eleito, mas para concorrer precisa da permissão do Conselho dos Aiatolás e do próprio líder aiatolá”, disse ele.
Kocher considera que se trata de uma república ambígua, com um lado republicano, com representação democrática, com partidos, e outro lado com limitações e proibições.
“Quem não for a favor do regime não tem representação, não poderá candidatar-se. As forças liberais, socialistas e outras correntes políticas que não concordam com o regime são silenciadas, não se manifestam para não se exporem à repressão.”
Acrescentou que, olhando da perspectiva do mundo ocidental, não se trata de uma democracia. “Se olharmos do lado persa, é o mais democrático que já existiu”, acrescentou.
O professor de relações internacionais Bruno Lima Rocha lembrou que esse modelo de regime político foi eleito em plebiscito em 1979, após um levante popular que ficou conhecido como Revolução Iraniana. Rocha afirma que este movimento pôs fim a um regime monárquico absolutista e subserviente às potências ocidentais.
O pesquisador acrescentou que o Conselho de Especialistas, controlado pelos aiatolás, equivale ao Supremo Tribunal Federal (STF), mas com mais poderes. Além disso, existe a Guarda Revolucionária, uma espécie de segunda força armada do país, responsável por proteger o modelo político atual.
Economia
O professor Bruno Lima Rocha destacou ainda que o Estado tem um papel central na condução da economia nacional, apesar da existência de liberdade económica para os empresários.
“Você pode ser um grande empresário. Todo o capitalismo no Irão está desenvolvido. Mas existe um conceito de segurança económica. Para garantir a segurança económica, há presença da hierarquia da Guarda Revolucionária em locais estratégicos do país, especialmente na área produtiva. Por exemplo, o Irão tem uma refinaria privada, mas é complementar. Não pode ser maior que a refinaria pública”, destacou.
A relação do empresariado com o Estado iraniano, que sofre um embargo económico liderado pelos Estados Unidos há 45 anos, é outra razão para a solidez do actual regime político, segundo o professor Bernardo Kocher.
“Os empresários devem estar muito fechados ao regime, porque a sua própria sobrevivência depende agora do regime, mesmo com sanções económicas”, destacou.
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