O enfrentamento dos gastos obrigatórios é peça fundamental para que o Orçamento se torne um instrumento de definição de prioridades, afirmou recentemente o ex-ministro da Fazenda e atual sócio da Tendências Consultoria Integrada, Maílson da Nóbrega, em evento para representantes do mercado financeiro organizado por Warren Investimentos.
Segundo o ex-ministro, não há país no mundo que tenha 98% do seu Orçamento comprometido com gastos obrigatórios. Um governo que tenha apenas 2% do Orçamento para despesas discricionárias é insustentável, disse Maílson.
O pior, acrescentou, é que os gastos obrigatórios chegarão a 99% muito rapidamente porque os fundos da segurança social continuam a crescer. A manter-se esta situação, o governo não pode realizar concursos nem pode conceder aumentos salariais aos funcionários públicos, considerou. “Isso cria o chamado efeito primavera. Em algum momento, os salários terão que ser aumentados”.
Ainda segundo Maílson, o Brasil ficou prisioneiro da armadilha da renda média e, assim como outros países latino-americanos, não consegue sair dela.
“O Brasil já cresceu no ritmo chinês entre 1967 e 1973 – em média 11,1% ao ano. Hoje é a metade disso em 10 anos”, disse, prescrevendo que a única forma de escapar disso é a tecnologia. Segundo ele, os países que escaparam são da Ásia ou do Leste Europeu – nenhum da América Latina.
“Tornamo-nos num país cuja economia é vítima de um baixo crescimento e habituámo-nos a isso. Há duas razões para este desempenho medíocre: a queda da produtividade e uma situação fiscal muito preocupante. Eu diria insustentável”, afirmou, acrescentando que esse processo começou com a Constituição de 1988, fonte do desastre fiscal no Brasil porque os políticos a utilizam como justificativa para combater a desigualdade com os gastos públicos.
Maílson defendeu, para reverter esse quadro, uma mudança estrutural já que os mecanismos de controle fiscal existentes hoje, como os gatilhos previstos no marco, por exemplo, são superficiais.
“Tem que haver uma mudança estrutural, um fim às coisas estúpidas”, disse, citando como exemplo a obrigação de vincular 25% da receita fiscal às despesas com a educação. “Há cidades onde as escolas só têm três alunos e o autarca é obrigado a gastar 25%. Há uma má alocação de recursos, com os autarcas pintando a escola três vezes por ano para cumprir o cronograma de gastos. Com isso, a produtividade cai e o poder de crescimento também”, afirmou o ex-ministro.
Maílson disse estar pessimista com a economia brasileira no curto prazo porque não vê disposição no atual governo para fazer tais mudanças. Mas reforçou o otimismo para o longo prazo porque, pelo menos, a questão do descolamento já começa a ser debatida pela ministra do Planejamento, Simone Tebet, e porque o Brasil tem um mercado financeiro consolidado e instituições sólidas no campo político.
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