Por Roberto Samora e Ana Mano
SÃO PAULO (Reuters) – Uma medida provisória do governo brasileiro que impõe novas regras para utilização de créditos tributários atraiu críticas dos exportadores do país nesta quarta-feira, com representantes de setores que passaram de considerar as medidas “inconstitucionais”, o que deixará tornando-os menos competitivos nos mercados globais.
A reação contra a MP anunciada nesta terça representa o mais recente teste nas relações entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o poderoso setor do agronegócio, que apoiou seu antecessor Jair Bolsonaro.
“Embora a implementação de ações para o equilíbrio fiscal seja fundamental, as medidas anunciadas violam diretamente a imunidade às exportações, o princípio da não cumulatividade, o princípio do não confisco, todos previstos na Constituição Federal…”, afirmou o Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), em nota.
Segundo Abag, a MP revoga uma série de mecanismos da legislação contributiva do PIS e da Cofins, que permitiriam compensar o saldo credor dos créditos presumidos dessas contribuições com eventuais dívidas controladas pela Receita Federal ou reembolsadas em dinheiro.
O Brasil é o maior exportador mundial de commodities, incluindo café, frango e setores impactados pela medida. Mas a indústria petrolífera, segmento em que o país tem ganhado importância, também destaca problemas no MP.
A ABPA e a Abiec, que representam gigantes da carne como JBS (BVMF:) e BRF (BVMF:), afirmaram que a medida obrigará as empresas a dependerem mais dos bancos para obter crédito, gerando despesas adicionais e onerando desnecessariamente suas operações.
“O efeito sobre os custos de produção é direto e imediato”, afirmaram em comunicado, acrescentando que a medida pode desencadear inflação alimentar e perda de empregos no Brasil.
“É preciso lembrar que esses créditos não constituem benefícios, pois foram acumulados ao longo da cadeia produtiva e representam um custo tributário indevido”, acrescentou a Abrafrigo, que também representa os processadores de carne bovina.
O governo brasileiro afirma que está tentando compensar a redução do imposto sobre a folha de pagamento em diversas indústrias, ao mesmo tempo que pretende arrecadar quase 30 bilhões de reais para eliminar o déficit primário este ano.
ABPA e Abiec, porém, afirmam que a medida contraria a lógica determinada pela regulamentação da Organização Mundial do Comércio – da qual o Brasil é signatário – que proíbe “exportações tributárias”.
A medida gera “uma restrição desproporcional e inconstitucional à atividade não cumulativa, além de tornar o Brasil um grande exportador de resíduos tributários, em total contradição com o que está determinado em nossa Constituição…”, afirmou o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé ).
O Cecafé, assim como outros setores, já entrou em contato com a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), para que a MP não seja aprovada no Congresso. A questão pode ser levada à justiça, disseram especialistas à Reuters.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) afirmou em comunicado que tomará todas as medidas legais e políticas para contestar os termos da MP, acrescentando que o presidente da CNI, Ricardo Alban, interrompeu sua participação na delegação oficial do governo brasileiro para Arábia Saudita e China, para tratar do assunto no Brasil.
A Anec, que representa os exportadores de grãos e cereais no Brasil, não respondeu imediatamente a um pedido de comentário. Nem a Abiove, que fala em nome dos processadores e tradings de soja, incluindo Bunge (NYSE:) e Cargill, com operações locais.
A associação dos produtores de biodiesel, Aprobio, afirmou que tentará convencer o governo a reconsiderar a medida para proteger os investimentos e promover a utilização de fontes de energia menos poluentes.
SETOR CRÍTICO DE PETRÓLEO
O Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), que representa as petrolíferas e distribuidoras de combustíveis, afirmou que a nova regra impacta o fluxo de caixa das empresas, que terão que utilizar outros recursos para pagar seus impostos além dos créditos de PIS/Cofins.
“Também afetará a competitividade da indústria nacional e as estratégias de investimento e inovação das corporações, comprometendo a dinâmica do mercado com perdas para a geração de empregos e renda, e impactos importantes na economia nacional”, destacou.
Abag lembrou que a desoneração da folha de pagamento terá alteração gradativa a partir de 2025, enquanto as medidas relativas à utilização de créditos de PIS/Cofins, bem como a proibição de ressarcimento do saldo credor oriundo de crédito presumido, são permanentes. e com efeito imediato.
“Com isso, o atual planejamento financeiro das empresas sofrerá implicações instantâneas, comprometendo os investimentos e contribuindo para o aumento da insegurança jurídica e empresarial no país”, destacou Abag, que também defende a “devolução” da MP pelo Congresso Nacional.
(Reportagem de Roberto Samora e Ana Mano; com reportagem adicional de Marcela Ayres e Bernardo Caram)
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