Nesta terça-feira, 11, a Câmara aprovou pedido urgente de projeto de resolução do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), que autoriza a Mesa Diretora a aplicar punições aos deputados que descumprirem o decoro. As medidas incluem a suspensão do mandato por até seis meses. Foram 302 votos a favor, 142 contra e uma abstenção. Os únicos partidos que apoiaram a rejeição da proposta foram PSOL e Novo. O PL liberou a bancada.
O mérito do projeto seria analisado posteriormente, mas foi adiado para quarta-feira, 12, após intenso debate. A iniciativa é a resposta política de Lira às brigas “quase físicas” ocorridas na semana passada e que envolveram parlamentares como Nikolas Ferreira (PL-MG), André Janones (Avante-MG) e Zé Trovão (PL-SC), durante a análise do pedido de revogação de Janones no Conselho de Ética.
“Não são assuntos ou casos esporádicos, têm acontecido repetidas vezes. No plenário, nem tanto. Nas comissões, de forma exagerada. Os deputados vão para as comissões sem terno e gravata, isso é falta de decoro. Todo mundo sabe: esta Câmara tem uma liturgia. Os deputados estão se agredindo verbalmente e fisicamente”, disse Lira, no plenário.
Alguns deputados, como Glauber Braga (PSOL-RJ), reclamaram do projeto. “O AI-5 do senhor Arthur Lira não pode ser aprovado hoje. Só o presidente da Câmara ter o poder de destituir um parlamentar é um absurdo”, afirmou o psolista, em referência ao ato mais forte editado pela ditadura militar no Brasil.
O presidente da Câmara rebateu e disse que a decisão não será só dele, mas da maioria absoluta do Conselho de Administração, que inclui vice-presidentes e secretários. Além disso, caberá ao Conselho de Ética referendar ou não as decisões. O presidente do colegiado, deputado Leur Lomanto Jr. (União-BA), foi favorável à medida. “Em breve poderá acontecer um crime, alguém atirar em um parlamentar”, declarou.
Segundo Lira, o objetivo é “instigar” o Conselho de Ética a agir com maior celeridade. Pelo projeto, o Conselho de Administração terá 15 dias para suspender cautelarmente o exercício do mandato de deputado ao tomar conhecimento do fato (uma briga, por exemplo). A decisão será então encaminhada ao Conselho de Ética, que terá o mesmo prazo de 15 dias para se posicionar. Pode haver um recurso.
A deputada Adriana Ventura (Novo-SP) também criticou o projeto. “É muito sério. Estamos falando de algo (o mandato) que foi legitimado pelo voto popular”, disse ela. “Tem muitos parlamentares truculentos, que eu teria vergonha de ter na minha casa. Mas eles foram eleitos e o nosso sistema permite isso”, acrescentou. “Somos piores que as decisões monocráticas que criticamos no Supremo Tribunal Federal (Tribunal Federal).”
Segundo Lira, a Polícia Legislativa receberá ordem da Diretoria para não interferir em nenhuma briga. “Com a Polícia Legislativa a partir de agora impedida de entrar no meio de uma discussão entre dois parlamentares, eles vão brigar, se quiserem brigar, se acharem que essa é a forma de resolver, vão brigar”.
A proposta foi feita por Lira em reunião do Colégio de Dirigentes nesta terça-feira. “Estamos perdendo o respeito. Não é aceitável que aconteça o que aconteceu no Conselho de Ética, no plenário e nas comissões. Na verdade, sempre as mesmas comissões”, declarou o presidente da Câmara aos dirigentes partidários, segundo relatos feitos para o Estadão/Transmissão pelos participantes da reunião, realizada na residência oficial da Presidência da Câmara.
De autoria de Lira, o projeto é assinado por todos os demais membros da Mesa Diretora da Câmara: o primeiro vice-presidente, Marcos Pereira (Republicanos-SP), o segundo vice-presidente, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), o o primeiro secretário, Luciano Bivar (União-PE), a segunda secretária, Maria do Rosário (PT-RS), o terceiro secretário, Júlio César (PSD-PI), e o quarto secretário, Lúcio Mosquini (MDB-RO).
“Não podemos mais continuar assistindo aos embates quase físicos que vêm ocorrendo na Câmara e que distorcem o ambiente parlamentar, comprometem seu caráter democrático e – principalmente – degradam a imagem do Parlamento na sociedade brasileira”, publicou Lira, no rede social X (antigo Twitter), ao anunciar publicamente a proposta.
‘Espíritos exaltados’
Na última quarta-feira, 5, a Câmara encerrou a sessão deliberativa no plenário sem votar nenhum projeto. Parlamentares disseram que o principal motivo foi o estado de saúde da deputada Luiza Erundina (PSOL-SP), que passou mal durante reunião na Comissão de Direitos Humanos e foi internada.
Erundina falava sobre um assunto do qual é relatora da comissão, quando sentiu falta de ar e teve que ser retirada da sala. No sábado, dia 8, ela recebeu alta do Hospital Sírio-Libanês, em Brasília, onde ficou internada. O parlamentar foi prefeito de São Paulo. Aos 89 anos, ela é a deputada federal mais velha desta legislatura da Câmara.
Segundo parlamentares ouvidos pela reportagem, o fato de os ânimos já estarem exaltados na Câmara após brigas ao longo do dia também influenciou no encerramento da sessão. “O que aconteceu aqui hoje foi muito grave, uma agressão. Estamos interditando o debate político e abrindo caminho para a violência e a agressão”, disse a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), na época.
“Hoje não vejo um ambiente calmo para seguirmos uma agenda neste plenário. Os ânimos estão exaltados.
Na pauta da Câmara estava o pedido urgente de projeto de lei que equipare o aborto realizado após 22 semanas de gestação e com viabilidade fetal ao crime de homicídio.
Também estava em pauta a urgência de um projeto de lei que impeça a aprovação judicial de acordos de delação premiada de presos. A proposta, que em tese poderia afetar o depoimento do tenente-coronel Mauro Cid contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, foi apresentada em 2016, no auge da Operação Lava Jato, pelo ex-deputado Wadih Damous (PT-RJ), hoje secretário da Comissão Nacional de Defesa do Consumidor em o governo Lula.
“Essa agenda que hoje foi apresentada é explosiva, não vai acabar bem. É uma agenda difícil, complexa, que não foi debatida”, criticou Jandira.
Confusão entre parlamentares quase gerou confrontos
Os deputados federais André Janones (Avante-MG) e Nikolas Ferreira (PL-MG) discutiram nesta quinta-feira, 6, na Câmara e tiveram que ser separados para evitar que fossem pegos. “Vou dar um soco na sua cara, seu idiota”, disse Janones. “Vamos, bata”, respondeu Nikolas.
A briga entre os dois começou devido à tumultuada sessão do Conselho de Ética, que julgou a representação do PL contra Janones pela prática da “rachadinha”, quando parte dos salários dos servidores do gabinete é repassada ao parlamentar.
Após o colegiado encerrar o caso por 12 votos a cinco, deputados que apoiavam o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e a base de Lula começaram a trocar insultos e provocações. Janones chamou os parlamentares de “boiola” – inclusive Nikolas – e os chamou de “para conversar lá fora”.
Quando a situação se agravou, a ponto de a Polícia Legislativa Federal precisar separar os parlamentares, Janones foi retirado da sala, mas Nikolas o seguiu pelos corredores da Câmara.
“Você é um preguiçoso, você é um mentiroso. Seu pedaço de merda. Vamos lá fora então, eu quero ver”, disse Nikolas. “Vamos, só nós dois. Tira a turma, tira a turma, tira a turma. Vagabundo, idiota, toma no cu, Bandido. Somos só nós dois. Vem cá”, respondeu Janones .
O deputado federal Jack Rocha (PT-ES) foi uma das outras pessoas que atuou para separar os dois. “Vamos, toc, toc, ‘rachadinha’”, continuou Nikolas. “Garoto golpista. Enfia na sua bunda, garoto. Vou dar um soco na sua cara, seu idiota”, ameaçou Janones.
“É muito fácil. Está funcionando. Venha aqui, seu idiota”, continuou Janones. “Você é um mentiroso. Isso é o que você é. Seu lixo”, rebateu Nikolas.
Janones também teve um confronto com outro deputado de Bolsonaro na saída do Conselho de Ética. Desta vez, foi o deputado Zé do Trovão quem quis atacar o político mineiro.
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