A Polícia Federal concluiu a investigação sobre o desvio de recursos federais da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e indiciou o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, suspeito de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. A investigação foi baseada em relatórios do Estadão.
Na época das reportagens, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cedeu às pressões do União Brasil – partido de Juscelino – e permitiu que o chefe de Comunicação permanecesse no cargo, apesar das suspeitas de desvio de recursos públicos. A permanência do ministro na Esplanada quebrou a promessa do petista de não receber no governo dirigentes envolvidos em irregularidades.
Nesta quarta-feira, 12, porém, o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), disse que Lula pretende tomar uma decisão sobre a situação do ministro e cobrou um posicionamento do União Brasil. “O presidente vai embarcar ou já embarcou para a reunião do G-7. Ele será informado de tudo e depois tomará uma decisão. proteger, defender ou acusar Se houver algum acontecimento, qual a reação você fica (no cargo) se defendendo?”, disse Wagner.
‘Novo fato’
Segundo o senador, o presidente “foi muito claro” com o auxiliar quando surgiram as primeiras suspeitas. “(Lula disse) ‘Vá lá e se defenda’. Ele se defendeu. Agora há um fato novo, que é a acusação.” No ano passado, Lula decidiu dispensar Juscelino após ser informado por organizadores do governo no Congresso que os padrinhos do ministro não aceitariam sua demissão sumária. Na prática, a destituição do chefe de Comunicação significaria votos contrários da bancada União Brasil – a terceira maior da Câmara – a projetos de interesse do Palácio do Planalto.
Em nota, Juscelino afirmou ontem que seu indiciamento pela PF é “uma ação política e previsível” e “parte de uma investigação que distorceu premissas, ignorou fatos e nem ouviu a defesa sobre o alcance da investigação”. O ministro das Comunicações disse ainda que a investigação “repete o modus operandi da Operação Lava Jato”.
‘Parcial’
O União Brasil manifestou ontem “total apoio” a Juscelino. O partido, por meio de nota de sua Executiva Nacional, criticou o que chamou de “preconceitos”.
“É importante esclarecer que esta investigação não tem relação direta com a atuação de Juscelino Filho como ministro das Comunicações. Curiosamente, ela teve início após sua nomeação para o primeiro escalão do governo federal, o que levanta suspeitas sobre uma possível atuação direcionada e parcial na investigação “, afirmou a legenda no comunicado oficial.
O partido também alegou a ocorrência de vazamentos “seletivos” e “descontextualizados” sobre Juscelino e disse que investigações semelhantes ocorridas no passado levaram a “condenações injustas”. “A acusação não deve significar culpa, e o princípio da presunção de inocência e do devido processo legal deve ser rigorosamente respeitado”.
Outros crimes
Ó Estadão apurou que o relatório final da investigação da PF cita indícios de outros crimes, como falsidade ideológica, frustração do caráter concorrencial da licitação e violação do sigilo na licitação, previsto no Código Penal. O documento foi enviado anteontem ao gabinete do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino. Agora, o ministro deve encaminhar o caso à Procuradoria-Geral da República (PGR), para que esta se pronuncie sobre uma eventual denúncia ou solicite novas diligências no caso.
Ontem, Juscelino cumpriu agenda em São Paulo, mas deixou o local sem falar com jornalistas. O ministro fez uma rápida aparição em evento organizado pela Associação Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações (Abrint), realizado na capital paulista.
Depois de falar por cerca de dez minutos para uma plateia de empresários, Juscelino deixou o local e embarcou em um veículo oficial. O secretário de Telecomunicações do ministério, Hermano Barros Tercius, assumiu o lugar de representante do departamento no evento. Questionado sobre o indiciamento de Juscelino, Tércio limitou-se a dizer que a medida “não deverá afetar de forma alguma” o funcionamento do ministério.
Financiamento público
Em janeiro do ano passado, o Estadão mostrou que Juscelino, quando era deputado, destinou R$ 5 milhões do orçamento secreto para pavimentar uma estrada de terra que passa em frente à sua fazenda, em Vitorino Freire (MA). O município é administrado por Luanna Rezende, irmã do ministro.
Alocada pelo Centrão, a Codevasf administrou a distribuição dos recursos do orçamento secreto. O ex-gerente da Codevasf que assinou o parecer autorizando o valor orçado para pavimentação foi indicado para o órgão pelo grupo político do ministro das Comunicações.
Pelo menos quatro empresas de amigos, ex-assessores e uma cunhada de Juscelino faturaram mais de R$ 36 milhões em contratos com a prefeitura de Vitorino Freire. O município administrado pela irmã do chefe das Comunicações contratou as empresas com recursos do orçamento secreto e das emendas parlamentares por ele atribuídas.
Em maio, a auditoria interna da Codevasf identificou irregularidades em obras realizadas em Vitorino Freire com recursos indicados por Juscelino. A conclusão veio após análise de dois contratos que totalizaram cerca de R$ 9 milhões e eram relacionados à construção de estradas na cidade do Maranhão. A fiscalização também constatou pagamentos indevidos à empresa contratada para as obras.
Criada na época da ditadura militar para desenvolver as margens do Rio São Francisco, a Codevasf tornou-se um canal de recursos para atender interesses eleitorais.
Operação
Oito meses depois da reportagem, Juscelino foi alvo da Operação Benesse – que já investigava irregularidades na Codevasf e passou a mirar suspeitas de fraude em licitações, lavagem de dinheiro e desvio de emendas parlamentares – e teve bens bloqueados por ordem do ministro do Supremo, Luís Roberto Barroso. Durante a ofensiva, agentes fizeram buscas em endereços ligados a Luanna Rezende, que acabou afastada do cargo de prefeita de Vitorino Freire.
Na época, a PF informou que a Operação Benesse foi resultado de outra ofensiva, iniciada em 2022, que tinha como alvo servidores suspeitos de participarem de fraudes em licitações da Codevasf. As diligências realizadas em setembro chegaram ao “núcleo público da organização criminosa, após rastreamento de indicação e desvio de emendas parlamentares destinadas à pavimentação asfáltica de um município maranhense”.
CGU
Em abril deste ano, um relatório preliminar elaborado por técnicos da Controladoria-Geral da União (CGU) constatou que a pavimentação da estrada que passa em frente à fazenda do ministro, no Maranhão, atendeu apenas às necessidades de Juscelino e não beneficiou a população local. população.
No relatório, a CGU sustenta que o serviço de asfaltagem não tem utilidade para a população local, pois não liga as vilas atendidas a uma rodovia ou ao centro da cidade de Vitorino Freire. O maior trecho pavimentado é justamente aquele próximo às propriedades do ministro e sua família.
“De um total de 23,1 km, envolvendo R$ 7,5 milhões, 18,6 km, 80%, beneficiariam propriedades do parlamentar e, ao que tudo indica, individualmente. Os 4,5 km restantes beneficiariam cinco aldeias locais e até de forma isolada sem integração com a rodovia estadual, nem com a sede municipal”, diz trecho do relatório da CGU.
Quando a reportagem foi divulgada, Juscelino Filho disse ser “o maior interessado” na resolução do caso e reiterou que a estrada atende sim centenas de moradores de Vitorino Freire. O ministro disse ainda que sua função como parlamentar é apresentar emendas, mas não executar e fiscalizar as obras que serão realizadas com os recursos.
Além de direcionar recursos do orçamento clandestino para a prefeitura comandada pela irmã, Juscelino acumula uma série de denúncias envolvendo desvio de recursos públicos. Indicado pelo União Brasil para Esplanada e indicado por Lula, o deputado licenciado enviou dados falsos à Justiça Eleitoral e utilizou avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para participar de leilões de cavalos em São Paulo. A informação é do jornal O Estado de S. Paulo.
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